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MAGNIFICATIONS Intervenção/Instalação de Murilo Salles na exposição Fotogramas: Arte e Cinema na Marieluise Hessel Collection 19 de Novembro a 04 de Janeiro de 1998 | ||
A instalação Magnifications é o contraponto aos trabalhos reunidos na mostra Fotogramas: arte e cinema na Marieluise Hessel Collection. Na segunda estão reunidos artistas plásticos que tornam a experiência e o imaginário do cinema como base ou referência para a realização de seus trabalhos, enquanto que na primeira ternos urna intervenção do cineasta Murilo Salles no território das artes plásticas. Esses procedimentos são a característica mesma da visualidade contemporânea: o livre trânsito dos autores entre os diversos campos expressivos e lingüísticos, hibridizando-os de maneira produtiva e desafiadora. Não há mais limites, não há mais fronteiras. Elas foram apagadas pelos sucessivos movimentos da crítica e da reescrita da história, de modo a possibilitar o fluxo continuo das imagens e das idéias como num sonho ou num fume. Colocado nas vitrines do edifício da Light (luz, essência do cinema), na forma de uma tela oca a neutralizar o sentido comum do equipamento arquitetônico, o trabalho funciona como uma espécie de peephole a instigar a curiosidade dos muitos passantes da avenida. Divididas em dois pares, sendo que um projeta-se sobre o vidro e o outro no fundo das vitrines, cada uma dessas duas telas exibe um fragmento em loop dos filmes Canto da Saudade, de Humberto Mauro e Macunaíma, de Joaquim Pedro de Andrade. Entretanto, alem de serem recortes escolhidos pelo artista, esses fragmentos sofreram uma outra intervenção, que é projetada na tela ao lado: a retirada de um grão, elemento primeiro na constituição da imagem fotográfica impressa no filme. 0 trabalho resulta numa bem construída metáfora plástica sobre as questões com que trabalham os cineastas. Se os artistas plásticos usam o cinema, desde os aparatos técnicos da sua produção ao imaginário criado por ele, como meio para abordarem questões próprias da linguagem e da representação visual, realizando desta forma operações de significação social e cultural, Murilo Salles recorre a uma manifestação da plástica contemporânea, a instalação, o trabalho site-specific, para abordar o universo do cinema. Seu trabalho constitui uma representação dos "opostos complementares" que armam a linguagem cinematográfica: "negativo/positivo, dentro de quadro/fora de quadro, opacidade/transparência", dimensão planar da tela/especialidade virtual da projeção, materialidade/ilusão. Magnifications desvenda a base do processo do cinema pois apóia-se na desconstrução do princípio da imagem cinematográfica. 0 grão retirado do fotograma, ampliado e projetado ao lado do fragmento do filme, representa a unidade inicial no registro de uma imagem e pode ser visto em toda sua beleza, movimentando-se na tela. Mas a instalação quer ir além do seu significado formal e técnico. A escolha dos filmes Canto da Saudade e Macunaíma trazem a perspectiva do cineasta sobre a tradição do cinema brasileiro em suas tentativas de pensar uma visualidade específica e local: o primeiro "parte de um pensamento orgânico/primitivo para a clara elaboração de uma estética visual brasileira em colaboração com Villa Lobos"*, e o segundo é tomado como "um pensamento crítico ao ideário do modernismo" e ao programa proposto pela Semana de Arte Moderna. Ivo Mesquita * Todas as referências entre aspas, no texto, foram extraídas de uma carta de Murilo Salles ao autor. |